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Bataguassu

Antônio Machado de Souza é Bataguassu, e Bataguassu é Antônio Machado de Souza; por Luís Carlos Freire

Neste texto, Luís Carlos Freire relata momentos que ele viveu com o ex-prefeito de Bataguassu, Antônio Machado de Souza. Acompanhe!

ANTONIO MACHADO DE SOUZA

A poucas horas tomei conhecimento da morte do dr. Antonio Machado de Souza, respeitável contador e advogado que praticamente inaugurou o primeiro grande escritório nessas áreas em Bataguassu, o CONT – LEX (Contabilidade e Lei).

Tenho lembranças muito agradáveis do dr. Antonio Machado desde a minha adolescência. Todas as tardes, após as 17h00, o escritório fechava e ele descia pela avenida Campo Grande até a casa de sua mãe, dona Maria Machado. Nesse transcurso, ele passava defronte a nossa casa, que ficava a poucos metros da nossa casa, de maneira que o víamos diariamente.

No final da década de 80 ele se candidatou a prefeito em Bataguassu. Eu tinha 22 anos de idade e, incentivado pelo professor de História, Rubem Antonio Felipe, lancei-me candidato a vereador ao lado de outros jovens de idades semelhantes à minha: Acir Murad e Francimar Macedo Formiga. Éramos do PMDB e apoiávamos Machado.

Algumas pessoas, acostumadas a interpretar o político ideal como aquela pessoa risonha e extrovertida, rotulavam o dr. Anônimo Machado de antipático e fechado, algo que colocava em risco a sua eleição. Até então Bataguassu tinha tradição de eleger pessoas muito mais velhas, desse modo não aceitou bem os nossos jovens nomes. Não nos elegemos, mas o dr. Antonio Machado chegou dignamente ao Paço Municipal, quebrando a velha tese de que dente elege. Recordo-me fotograficamente de seus discursos muito bem elaborados, articulados e coesos. Foi marcante.

Na verdade, lembro-me de muitos episódios passados nos palanques, dignos de interessantes crônicas. Não me lembro exatamente o nome de um deputado que veio de Campo Grande, mas ele trouxe um porrete de madeira para realçar o seu discurso efusivo e, por vezes exagerado ao dizer que “matava a cobra e mostrava o pau”, dando pauladas no ar a ponto de os demais candidatos se afastarem com medo de serem atingidos. Esse dito comício se deu em frente ao Banco do Brasil. Não sei o que Antonio Machado pensava daquela bizarrice, mas deveria estranhar muito. Ele, que tinha uma retórica totalmente diferente.

Outra vez o sr. Ildo Virtuoso dos Santos, também candidato a vereador, pessoa muito simples e querida em toda a Bataguassu, costumava usar os seus minutos de fala para elogiar o Dr. Antonio Machado, de maneira que certa vez deu um susto no povo presente ao comício, quando disse: “eu comparo Machado a um cavalo! Mas ao cavalo marchador porque o nome dele é Machado, e quem é Machado é Machador, e o cavalo marchador é o melhor cavalo que existe. Machado é Machador!” O comício, que até então não tinha uma tônica hilária, fez o povo rir aos cântaros. Ninguém conseguiu segurar as risadas. No início as pessoas levaram um susto quando ele disse “eu comparo Machado a um cavalo!”. Como é que alguém compara o seu candidato a um cavalo? Mas logo ele explicava o porquê, servindo-se de sua filosofia de vida, pautada pela simplicidade. O próprio Dr. Antonio Machado deu aquela olhada de rompante, sem entender de início, meio assustado. Mas no final tudo acabou bem.

Outra vez, o Sr. Ildo, de posse do microfone, levou o povão às gargalhadas, quando, dentro de um contexto, disse: “Eu comparo Machado a uma mala!” E lá ia o povo se debulhar em risadas. Logo ele pergunta se o povo ali presente gostava de uma mala velha, estragada, bufenta, destrambelhada. E ele mesmo respondia “claro que não! As pessoas gostam de uma mala boa, cheia de coisas boas dentro, cheia de ouro, de diamantes, com roupas boas, joias, com chave, segura. E Machado é essa mala boa, nova, segura. Machado nunca foi e nunca será mala véia, rasgada como os que estão do lado de lá” (referindo-se à oposição). Na verdade, o sr. Rildo nunca pretendeu transformar a sua fala em Stand’up. Ele discorria sobre Machado com base no seu universo social, cujos seus filosofares não eram diferentes dos mais renomados filósofos. A essência era a mesma, só os argumentos eram diferentes.

Uma vez, de tanto que algumas pessoas o enxovalhavam – devido às suas falas – ele foi falar com a dona Wilma Machado de Souza, esposa de Machado. Perguntou se ela achava errado o seu modo de se expressar em palanque. Presenciei quando dona Wilma, sabiamente, e bastante risonha, respondeu que ele continuasse o seu estilo, que Machado até achava engraçado e sabia que ele até podia causar estranheza no início, mas quando explicava, deixava tudo claro, exaltando Machado como o melhor. O sr. Ildo, que também era muito risonho, ria muito.

Hoje, ao tomar conhecimento da morte do dr. Antonio Machado, passou esse filme na minha cabeça. São episódios engraçados, que parecem não combinar com ele, mas lhe pertenceram.

Antonio Machado na verdade nunca foi o homem antipático que alguns julgavam. Ele, sim, era um homem de sorriso difícil e de certo modo enérgico, mas a beleza da humanidade está em suas diferenças. As pessoas têm personalidades diferentes. Era essa a sua impressão digital. Mas, pensando bem, como estariam muitos municípios brasileiros, ou melhor, o Brasil inteiro, se todos os prefeitos, secretários municipais e vereadores fossem iguais a Antonio Machado de Sousa em honestidade? Precisa argumentar mais? Essa característica de decência e honradez é genética em sua família, pois meus pais conheceram os pais dele e sempre enalteceram cada um, elegendo-os não apenas como exemplos, mas como lição. Tive o prazer de conhecer os irmãos dele, sua mãe e ver de perto o quanto eram legítimas as informações dos meus pais. Antonio Machado foi uma joia rara. A forma em que ele foi feito se quebrou.

Quando o meu pai faleceu, há quatro anos, o visitei e conversamos uns trinta minutos, ocasião em que falamos sobre o Museu Helena Meirelles, que ele achou fantástico, depois lastimou a morte da esposa (assunto que também me abalou profundamente, e que percebi ser responsável por uma espécie de tristeza crônica que o acometeu e o definhou), e falamos sobre mais alguns fatos passados de Bataguassu. Infelizmente foi o nosso último encontro. Coincidentemente, naquela mesma semana, para minha surpresa, recebi a visita de sua irmã, dona Ana Machado, mulher muito especial e querida por todos nós.

A morte é a única certeza. Infelizmente temos prazo de validade. Não nascemos para lajeiro. O bom é quando quem morre, deixa vidas. Antonio Machado, pelo menos para mim, serve para jogarmos holofotes sobre os valores que devem estar presentes nas vidas de muitos homens públicos e de muitas mulheres públicas. A sua morte permite nascer muitas reflexões, e oportuniza a todos resgatar, com urgência, para as nossas crianças e jovens, a honestidade e a competência. Estamos carentes de líderes qualificados, visionários, competentes como foi o contador, o advogado e o prefeito Antonio Machado de Souza. Grande parte das cidades do nosso país está nas mãos de seres humanos toscos, inergúmenos, que são bons apenas em cuidar de gado. Machado, na condição civilizada e cidadã de gestor, cuidou dos cidadãos bataguassuenses – sem paternalismo – valendo-se de uma administração eficaz e honesta. Diferente de um presidente famoso que a vida inteira se pautou na palavra honestidade, família, pátria e religião (sem nunca ter vivido na prática tais palavras), Machado praticou esses valores sem nunca os usar como discurso. Como disse Karl Marx “A prática é uma e o discurso é outro”. Desses estamos cheios. O escritor francês Saint Exupèry escreveu que “Aqueles que passam por nós não vão sós. Levam um pouco de si, deixam um pouco de nós”. Machado nos deixou muito. Como escrevi anteriormente, um dia o sr. Ildo, homem simples e cheio de sabedoria popular, disse em palanque, que “Machado era um cavalo marchador porque era bom, competente, sério, honesto e decente”… Hoje, sem nunca imaginar essa possibilidade, reconheço que Machado, de fato, tem toda relação com essa pessoa que o sr. Ildo descreveu na década de 80. Ele fez a marcha do progresso em Bataguassu. Ensinou o povo bataguassuense a marchar rumo ao bem. Uso as palavras dele para dizer aos seus familiares Muito Obrigado por ter marchado com ele durante poucos anos da minha vida. O sr. Ildo estava muito certo! (Luís C. Freire – do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte – IHGRN).

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